quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

"Ao ver-te, Lisboa, Lisboa..."

A água quente jorrava pelo corpo, relaxando-o. A pouco e pouco, os músculos tensos, ressentidos de um cansativo dia diferente, sediam perante a temperatura alta. Nuvens de vapor enchiam o espaço, escuridão pontuada por três pequenos pontos de luz, oscilantes.
Enquanto a água caia sonoramente sobre a cabeça, tombada, os pensamentos vagueavam, absortos. Recapitulavam a jornada, elencavam momentos.
Lembro-me dum deles. Encostado a um banco, esperando pela próxima paragem, lancei um olhar em meu redor. De casaco vermelho e cabelo, loiro, apanhado, havia acabado de entrar, tendo permanecido à porta. No outro banco, de mãos nos bolsos, fitava a assistência, enquanto que uma das pernas das calças de ganga, clara, não tapava a língua das botas, castanhas. Ao seu lado, uma figura obesa trauteava labialmente uma música que saia dos finos fios brancos, realçados na blusa de malha, azul, D&G, certamente da feira de Carcavelos. Outro, de cicatriz, profunda, na cara, procurava fazer um cigarro, mesmo que o balanço da carruagem insistisse em não o permitir. Uma figura alta, chocolate, havia entrado a rir, e ocultara-o. Inspeccionava consecutivamente as palmas das mãos, brancas, rugosas.
Caras sem origem, rostos sem fim. Apenas pessoas com destinos e horários, que entram e saem, e fazem daquele um dia absolutamente normal, mais um, no lento, moroso e rotineiro desenrolar das suas vidas.
Serei eu mais um?
Rapidamente fui contagiado pelo espírito cosmopolita, que nos impulsiona e constrange quem não se filia nos ritmos frenéticos. Somos coagidos a correr, a lançar-nos escada acima, escada abaixo, como se de nós dependesse o futuro do mundo. No entanto, procuramos apenas apanhar a ultima carruagem. Virei eu a ser mais um que anseia apanhar esta última carruagem?
Por vezes parece que está tudo tão decidido, tão claro, planeado e certo. Mas outras vezes…
Enquanto a água continuava a jorrar tepidamente, eu pensava naquela cidade, naquele cosmopolitismo, e naquelas caras, rostos que vão e vêem, eles não sabem quem somos, nós não sabemos quem eles são. E nós, sabemos quem nós somos?

1 comentário:

Meire disse...

Quer dizer que enquanto estavas a dar banho à "minhoca" à luz das velas, começou a imaginar a sua vida quiçá em LX, não me diga que apenas se imaginou a andar de metro???Nem parece seu, não se ter imaginado a andar por toda uma Baixa ou todo um Chiado e quiça dar um polinho à Brasileira, para uma tertúlia e depois dar um saltinho a Belém, para comprar uns pastelinhos para os papas, quando for de fim-de-semana à sua alegre casinha predida no meio da Serra :p Jokas maluko e não penses muito que isso faz rugas e para o crescimento da barba :p