quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Pastéis de Nata

Fez-me muita impressão aquilo que disseste ontem à noite, aí nesse sofá… Talvez eu próprio ainda não tivesse pensado nisso, pelo menos nesses termos…
Não sei o que mais me abalou, se o que disseste, se o facto de teres sido tu a dizê-lo. Tu, que sempre pareceste tão seguro e imune às separações. Não és desumano, nem frio, nem desligado. Muito pelo contrário. Mas a segurança, com que pensas e falas, faziam supor que as despedidas não eram, para ti, um problema, pelo que as aceitavas passivamente como outro qualquer processo da vida.
Vais ser um amigo que eu vou guardar para sempre, porque me ajudaste a crescer, e muito! Espero que nunca nos percamos, que nunca nos esqueçamos e que nunca sintamos a falta um do outro, porque será sinal de que continuamos a fazer parte da nossa vida.
Gostava vivamente que aceitasses aquilo que te quero pedir. Era a maior prenda que me podias dar.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

"Ao ver-te, Lisboa, Lisboa..."

A água quente jorrava pelo corpo, relaxando-o. A pouco e pouco, os músculos tensos, ressentidos de um cansativo dia diferente, sediam perante a temperatura alta. Nuvens de vapor enchiam o espaço, escuridão pontuada por três pequenos pontos de luz, oscilantes.
Enquanto a água caia sonoramente sobre a cabeça, tombada, os pensamentos vagueavam, absortos. Recapitulavam a jornada, elencavam momentos.
Lembro-me dum deles. Encostado a um banco, esperando pela próxima paragem, lancei um olhar em meu redor. De casaco vermelho e cabelo, loiro, apanhado, havia acabado de entrar, tendo permanecido à porta. No outro banco, de mãos nos bolsos, fitava a assistência, enquanto que uma das pernas das calças de ganga, clara, não tapava a língua das botas, castanhas. Ao seu lado, uma figura obesa trauteava labialmente uma música que saia dos finos fios brancos, realçados na blusa de malha, azul, D&G, certamente da feira de Carcavelos. Outro, de cicatriz, profunda, na cara, procurava fazer um cigarro, mesmo que o balanço da carruagem insistisse em não o permitir. Uma figura alta, chocolate, havia entrado a rir, e ocultara-o. Inspeccionava consecutivamente as palmas das mãos, brancas, rugosas.
Caras sem origem, rostos sem fim. Apenas pessoas com destinos e horários, que entram e saem, e fazem daquele um dia absolutamente normal, mais um, no lento, moroso e rotineiro desenrolar das suas vidas.
Serei eu mais um?
Rapidamente fui contagiado pelo espírito cosmopolita, que nos impulsiona e constrange quem não se filia nos ritmos frenéticos. Somos coagidos a correr, a lançar-nos escada acima, escada abaixo, como se de nós dependesse o futuro do mundo. No entanto, procuramos apenas apanhar a ultima carruagem. Virei eu a ser mais um que anseia apanhar esta última carruagem?
Por vezes parece que está tudo tão decidido, tão claro, planeado e certo. Mas outras vezes…
Enquanto a água continuava a jorrar tepidamente, eu pensava naquela cidade, naquele cosmopolitismo, e naquelas caras, rostos que vão e vêem, eles não sabem quem somos, nós não sabemos quem eles são. E nós, sabemos quem nós somos?